Mestre do teatro, Naum Alves de Souza conversa com alunos de Pedagogia

A fala mansa, o olhar doce, e o jeito bonachão enganam os mais desavisados, trata-se de um dos maiores nomes do teatro brasileiro contemporâneo
Por Márcio Aguiar

Dramaturgo, diretor de teatro, artista plástico, roteirista, cenógrafo, figurinista, criador de bonecos e professor. Um exagerado. Naum Alves de Souza, 72 anos, um dos mais profícuos e exuberantes profissionais do teatro brasileiro contemporâneo realizou na quarta-feira (15), uma palestra – roda de conversa – na sede do Lions Clube de Indaiatuba. O evento que foi aberto ao público faz parte da programação “Cultura Falada” e contou com a participação dos alunos do 1º e 7º semestres do curso de Pedagogia da Faculdade Max Planck.

A fala mansa, o olhar doce, o jeito bonachão e um irresistível sotaque sertanejo enganam os mais desavisados. Trata-se de um dos maiores nomes da história do teatro brasileiro. Perguntado a ele sobre o início de sua carreira, o teatrólogo, sempre sorridente, respondeu: “na sala de aula”. Sim, Naum também é educador.

Autor de peças como “Aurora da Minha Vida”, “No Natal a Gente Vem te Buscar” e “Um Beijo, Um Abraço, Um Aperto de Mão”, seu talento para as palavras o colocou no privilegiadíssimo panteão dos grandes dramaturgos brasileiros, ao lado de nomes como Nelson Rodrigues, Jorge Andrade e Tennessee Williams, escritor americano, vencedor do Prêmio Pulitzer por “A Streetcar Named Desire” em 1948 e por “Cat on a Hot Tin Roof” em 1955, suas referências. Suas peças não evocam nenhum universo marginal espetaculoso, tampouco a violência urbana fantasiosa. Naum fala de seres comuns, cujas trajetórias revelam uma crônica cotidiana, muitas vezes nostálgica. A complexidade de suas ideias é construída de forma simplificada, com textos enxutos e simples, no entanto, muito bem escritos. Impossível não se emocionar com seus textos.

Cenógrafo e figurinista

Quem não assistiu Vila Sésamo na década de 70? Sua obra como cenógrafo e figurinista também é admirável, e, quem era criança na década de 1970, deve um sorriso pro Naum, que foi o criador dos bonecos Garibaldo e Gugu, num dos primeiros programas infantis da TV brasileira, ao lado de Sônia Braga e Armando Bogus. Dois dos maiores shows musicais da época, também foram produzidos por ele. Foi ele quem criou a cenografia e figurinos do show “Falso Brilhante” de Elis Regina, e fez o roteiro do espetáculo “O Grande Circo Místico”, de Chico Buarque e Edu Lobo. Não poderia deixar de citar. São dele os cenários e figurinos de uma das peças mais importantes do teatro nacional em todos os tempos, “Macunaíma” – o herói sem nenhum caráter – de Mário de Andrade e adaptado e dirigido por Antunes Filho no teatro.

Dramaturgo

Para o autor o grande ponto de partida é o texto. “O teatro é uma arte que faz pensar”, comentou Naum. Segundo o dramaturgo “ler texto não é uma coisa muito fácil. Não é uma atividade prazerosa não”, ressaltou. A genialidade do escritor é suplantar as fraquezas dramatúrgicas do texto e focar a encenação ao que realmente interessa ao espectador, que é o trabalho do ator. De acordo com ele “a literatura é uma aventura bem solitária”, disse, referindo-se ao pouco costume da leitura das pessoas. “As pessoas leem muito pouco”, afirmou.

Obsessivo com o texto, o teatrólogo sempre teve bom olho para entender o trabalho do ator. “Eu tenho um processo de trabalho mais lento. Eu seguro muito o ator na mesa. Fico muito tempo lendo o texto, descobrindo junto como o ator entende cada diálogo, tentando tirar algo mais dali. Dirigir Cleyde Yáconis em “Longa Jornada de um Dia Noite Adentro” foi memorável. Ela me trouxe coisas diferentes, resolvia os impasses da personagem de um jeito que é um mistério. E olha que tenho um bom olho para entender como o ator trabalha. Alguns são mais resistentes à orientação do diretor, outros gostam mais de dialogar. Existem os atores que demoram a resolver o personagem e, de uma hora para outra, encontram uma ótima solução. A Cleyde era muito racional, mas de uma intuição incrível. Era uma atriz muito boa de dirigir”, contou.

Diretor

Quando se pensa em alguém como um “homem de teatro”, esse alguém é Naum Alves de Souza. Como diretor, dirigiu atores como Marieta Severo, Nathalia Timberg e outros tantos nomes consagrados. Na peça “Dona Doida”, onde dirigiu a atriz Fernanda Montenegro, a “A Primeira Dama do Teatro Brasileiro”, a grandeza do trabalho de Naum está na genialidade de transformar as mais complexas relações dramatúrgicas na forma mais simples e clara de comunicação com o espectador.

“Quando a Fernanda me convidou para fazer Dona Doida, durante a ponte aérea pro Rio, eu fui redigindo a minha carta de demissão” (risos). “Como é que eu vou enfrentar essa mulher que sabe tudo”? Ela já fez de tudo. Ela é um nome enorme, ela não vai me obedecer. O que eu estou fazendo aqui?”, contou despertando risos dos espectadores.

Conforme ele, quando chegou ao Rio, “sem que eu falasse nada, sem que eu entregasse a carta, ela me disse assim: Eu já fiz muita coisa. A minha carreira foi de todos os gêneros, mas o que eu quero agora é me despir de tudo, esquecer tudo que eu sei e vamos começar esse trabalho”, relembrou o episódio. “E realmente foi assim! Ela se despiu de tudo. Ela trabalhou feito uma doida. Ela pegava aquele texto e decorava, decorava, decorava”, disse.

Talvez seu maior êxito tenha sido escrevendo para o teatro. São mais de 40 peças e sucessos como “No Natal a Gente vem te Buscar”; “A Aurora de Minha Vida”; “Um Beijo, um Abraço, um Aperto de Mão”. Muitas vezes premiado recebeu três Moliéres, cinco Mambembe, dois APCAs, prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte. Segundo ele, hoje está muito mais complicado trabalhar com os atores da nova geração. “Como fico muito dedicado à leitura do texto com os atores, de um tempo para cá a coisa ficou meio complicada. Os atores de televisão não têm a menor paciência para isso. Eles foram acostumados a outro ritmo. Recebem o texto para gravar amanhã, então precisam resolver logo como vai ser a cena e o personagem. E esse é o jeito deles. Mas não é o meu. A agenda de quem faz televisão também ficou muito mais complicada de uns anos para cá”, afirmou.

O primeiro contato com a atriz Marieta Severo aconteceu através de uma ex-aluna, a atriz Analu Prestes. Em 1971, Analu começou a carreira como atriz ao protagonizar o curta “Julia Pastrana”, de Naum.

Na peça “No Natal a Gente Vem te Buscar, radiografia da solidão em família, em especial na fase adulta, onde a atriz Marieta Severo interpretou a Solteirona, o diretor contou que “Marieta construiu uma figura crível, principalmente porque suas reações em cena eram movidas pela escuta dos que estão à sua volta”. Como era de se esperar, ela tinha uma veia cômica desde aquela época, e acertava sempre no timing de humor. E também na contundência necessária ao registro dramático de uma mulher que passa a vida fazendo pouco mais que mudar cadeiras de lugar”, citou.

Conforme ele foi depois desse papel que a atriz iniciou o grande sucesso. “A Analu Prestes que tinha sido minha aluna, também veio, assistiu e falou para a Marieta sobre o roteiro e a Marieta veio assistir. Para ela representou muito fazer aquele papel. A Marieta até então, não era um nome muito marcante no cenário teatral. Ela carregava aquela coisa de ser a mulher do Chico. Não se falava em Marieta, falava a mulher do Chico. E vamos combinar que é difícil você competir com Chico Buarque.

Ele era muito famoso, e quando a Marieta fez esse papel da solteirona, ela fez muito sucesso, chamou a atenção, e ganhou todos os prêmios, e a partir dali a carreira dela foi outra”, explicou.

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